BANCO PÚBLICO | NA MIRA DE BOLSONARO, BNDES DIVULGA RESULTADO POSITIVO DE EMPRÉSTIMOS INTERNACIONAIS

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BANCO PÚBLICO | NA MIRA DE BOLSONARO, BNDES DIVULGA RESULTADO POSITIVO DE EMPRÉSTIMOS INTERNACIONAIS
Importante na retomada da economia, BNDES investiu mais de R$ 500 bilhões em infraestrutura de 2007 a 2017 / Arquivo/Agência Brasil

Parlamentares da oposição alertam para tentativa de privatização da instituição e outros bancos públicos como BB e Caixa

Eduardo Miranda | Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) – As acusações de Jair Bolsonaro (PSL) e integrantes de seu governo, nos últimos meses, de que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) agiu de acordo interesses internacionais de aliados do Partido dos Trabalhadores (PT), o que teria colocado a instituição em risco, caíram por terra nesta segunda-feira (16). A “Nota sobre financiamento à exportação de serviços”, divulgada no site do BNDES, informa que praticamente todo o valor em desembolsos para empreendimentos em 15 países já foi devolvido. Segundo a nota, US$ 10,3 bilhões dos US$ 10,5 bilhões já retornaram ao Brasil.

“A exportação de serviços, quando bem aplicada, é reconhecida mundialmente como importante instrumento de um país para estímulo à geração de empregos, ao aumento da atividade industrial e à obtenção de saldos positivos em balança comercial”, destaca um trecho da nota divulgada pelo banco público.

Privatizações

Uma das bandeiras defendidas por Bolsonaro e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, é reduzir a importância do BNDES em financiamentos que alavancam a economia e geram empregos e dar ao banco outra função, a de gerir as privatizações de grandes empresas públicas que o governo pretende liquidar.

Membro da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre práticas ilícitas no âmbito do BNDES, o deputado federal Glauber Braga (Psol-RJ) disse ao Brasil de Fato que há uma clara movimentação do governo federal para criminalizar a instituição e dar início à privatização dos demais bancos públicos.

“É uma tentativa de ampliar a presença de bancos privados e as pessoas terem que pagar juros ainda mais altos, sem qualquer tipo de sustentação de programas fundamentais que têm como necessidade a existência de bancos públicos. Temos que resistir, porque essa guilhotina é parcelada: ataca-se o BNDES e depois farão o mesmo para privatizar Banco do Brasil e Caixa”, afirma Glauber.

No início do mês, a Câmara Federal sediou um seminário de lançamento da Frente Parlamentar em Defesa da Soberania Nacional que contou com a presença da ex-presidenta Dilma Rousseff, de Fernando Haddad (PT), de Guilherme Boulos (Psol) e outros parlamentares de partidos da oposição. Ao ler o manifesto lançado na ocasioão, o ex-senador Roberto Requião (MDB-PR) destacou a importância de bancos públicos para um país.

“O governo atual se propõe a acabar com o crédito e os bancos públicos. O Banco do Brasil, a Caixa Econômica, o BNDES, BNB e o BASA estão ameaçados. Ao longo da história do Brasil, os bancos públicos têm sido indispensáveis ao desenvolvimento sustentável e ao progresso do país. Fazem o que nenhum banco privado quer fazer: financiar com juros acessíveis a moradia, a agricultura familiar, a infraestrutura e os investimentos de longo prazo”.

O BNDES é um dos instrumentos mais importantes para a retomada do crescimento do país e também para a geração de empregos. De 2007 a 2017, o banco investiu R$ 509,5 bilhões em obras de infraestrutura, 287% a mais que os R$ 131,6 bilhões liberados de 1997 a 2007.

Edição: Mariana Pitasse

EDUCAÇÃO | COMO OS CORTES DE BOLSAS AFETAM A VIDA DE MILHARES DE CIENTISTAS NO BRASIL

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EDUCAÇÃO | COMO OS CORTES DE BOLSAS AFETAM A VIDA DE MILHARES DE CIENTISTAS NO BRASIL
Doutorando do Instituto de Química da USP, Mateus Carneiro é um dos cientistas que esperam pela retomada das bolsas / Foto: Pedro Stropasolas.

Orçamento da Capes para 2020 não permite novas bolsas; 83 mil pesquisadores do CNPq podem ficar sem receber em outubro

Pedro Stropasolas | Brasil de Fato | São Paulo (SP) – Em sua cruzada contra a ciência e o conhecimento, o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) tem um novo alvo estratégico: o fomento à pesquisa no Brasil.

Com os cortes de verbas anunciados ao longo dos últimos meses, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) podem interromper suas atividades.

No início do mês de setembro um corte de mais 5.613 bolsas de estudos para pesquisas de pós-graduação – referentes a trabalhos de mestrado, doutorado e pós-doutorado – foi anunciado pela Capes.

Na última quarta-feira (11), o Ministro da Educação, Abraham Weintraub, reduziu parcialmente o corte e anunciou que a Capes receberá R$ 600 milhões para a manutenção de 3.182 benefícios vigentes. O dinheiro, no entanto, abrange apenas os cursos com as melhores conceitos de acordo com a agência e será suficiente para bancar somente os atuais bolsistas.

Se nada mudar, a Capes terá, em 2020, pouco mais de R$ 3 bilhões para custear as cerca de 215 mil bolsas de formação de professores, graduação, pós-graduação e intercâmbio.

No total, a Capes já cortou 11.800 bolsas neste ano. Até o momento, 8.629 vagas em pós-graduações seguem travadas para novos alunos.

Sem sustento

“A partir do momento que não tem bolsa, não tem dinheiro, como eu vou me sustentar aqui, numa cidade como São Paulo?”, indaga Mateus Carneiro, doutorando no Instituto de Química, da Universidade de São Paulo (USP). A instituição é referência no estudo da História e Filosofia da Química.

Após um ano de estudo e um processo seletivo com provas em inglês e espanhol, Carneiro foi contemplado com uma bolsa da Capes para financiar os quatro anos de doutorado. Isso após 6 meses sem receber remuneração pela pesquisa – acumulando boletos e contas a pagar.

No dia 2 de setembro, após o comunicado do MEC, ele recebeu um e-mail do Programa de Pós-Graduação da USP comunicando que sua bolsa havia sido cortada.

Sem renda e com dedicação exclusiva à pesquisa – em função da qual passa mais de dozes horas diárias em seu laboratório –, o doutorando pretende fazer bicos como professor de química em escolas básicas. “Essas agências de fomento são importantes justamente para a gente conseguir sobreviver aqui”, argumenta.

Após a declaração de Weintraub, anunciando a retomada de uma parcela dos investimentos, Mateus espera a volta de sua bolsa, que ainda não foi confirmada pelo Programa. “Aqui dentro da instituição, da USP, a gente vê que a educação vem sendo corroída por dentro. O próprio Ministério da Educação está acabando com a pesquisa nas universidades públicas do Brasil”, desabafa.

Bolsas do Cnpq com futuro incerto 

No mês de agosto, o governo federal também anunciou que não fornecerá recursos para financiar 83,4 mil bolsas de estudos e pesquisas em andamento. Também ficam suspensas as assinaturas de novos contratos, previstos para este ano no Orçamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), órgão ligado ao ministério da Ciência e Tecnologia.

O ministro de Ciência e Tecnologia Marcos Pontes prometeu um remanejamento interno no orçamento do órgão para pagar os R$ 82 milhões referentes às bolsas de pesquisa de setembro deste ano. Não há, porém, qualquer garantia de continuidade dessas bolsas até o fim do ano. O pagamento depende da liberação do recurso por parte do Ministério da Economia.

Com déficit de R$ 330 milhões previsto para este ano, o CNPq pretende remanejar a verba destinada ao fomento, para pagar as bolsas em outubro. A área de fomento é utilizada para custear equipamentos, insumos, manutenção dos laboratórios e materiais para as pesquisas.

A medida impõe outra problemática. Além da incerteza em relação ao pagamento das bolsas, a pesquisa sofre com os problemas estruturais das instituições públicas de ensino.

Marcos Gregnani é bolsista do CNPq e doutorando em Biologia Molecular pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Ele  pesquisa novas formas de prevenção para doenças metabólicas, como a obesidade e a diabetes.

O pesquisador relata as dificuldades com a manutenção dos biotérios no departamento de Biofísica, que vem sendo impactado pelo racionamento da ração para os animais e a falta de refrigeração adequada.

“Outras universidades com menos recursos que a nossa já interromperam o trabalho com animais. Você tem aí um trabalho de quatro gerações de pesquisadores. É uma parte da ciência que pode ser jogada no lixo”, desabafa.

Segundo o Painel dos Cortes, divulgado pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil (Andifes), o MEC cortou o equivalente a 30% do orçamento destinado à USP.

São Paulo é o estado com o maior número de pesquisadores ameaçados pelos cortes no CNPq. Os 18.470 bolsistas representam 22% do total no país. Os cortes também afetam outra modalidade de bolsas da agência, as do Edital Universal 2018, que selecionou 5.572 projetos.  O cancelamento das bolsas, divulgado em abril, impediu 2.516 pesquisadores de contratarem técnicos especializados para o desenvolvimento de suas pesquisas.

Sem perspectiva de renda após outubro, Gregnani teme pelo fim ao fomento a pesquisa. “A educação não pode ser uma pauta de direita ou uma pauta de esquerda, ela tem que ser uma pauta do país. A população precisa entender que a gente é isso, que nós somos parte deles”, defende.

Confira a videorreportagem Cortes de Bolsas: ciência e educação em risco:

Edição: Rodrigo Chagas

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XOTE BANDEIROSO – LÍNGUA DE TRAPO – 1982 – COMPOSIÇÃO: LAERT SARRUMOR

 

Ai! Meu Deus!
Essa máquina aperreia
(que aperriação)
Passo o tempo
trabalhando,
em completa agonia
Em total escravidão
Mas eu já nem penso mais
em voltar pro meu sertão
(nhanhanhão, em voltar pro meu sertão)

Quando eu vim
lá do Nordeste,
eu era cabra da peste
Patola e folgazão
Trabalhando noite e dia,
nem sabia que existia
O índice da produção
Os ome lá da indústria,
era cheio de astúcia
e de muita ilustração
O patrão apoquentava
e quanto mais eu trabalhava
Menos eu tinha razão
Eles vinha e dizia:
Severino, seu destino
é ser orgulho da Nação
Se mostrar para o Brasil,
inté na televisão
Hora extra, mais apreço,
tudo isso a baixo preço,
era a competição
E entonce eu fui eleito
o Operário Padrão
(nhanhanhão, o Operário Padrão)

Ai! Meu Deus!
O mundo dá tantas volta
(velho mundão)
Na conversa com os amigo,
eu fui vendo os perigo
Recebendo informação
E hoje eu nem
quero lembrar
dos tempo de servidão
(nhanhanhão, dos tempos de servidão)

Minha vida de pelego
se mudou c’o desemprego
c’os tempos de recessão
A fome foi apertando
e em cada emprego que arrumava
mudei minha posição
Da imprensa
perdi o medo,
na prensa perdi o dedo,
fui ganhando instrução
Sempre bom cabra-da-peste,
botei medo na Fiesp
firme na negociação
Eles ainda me dizem:
Severino
bom menino, deixa de
subversão
Tu acaba na cadeia,
teu lugar é no formão
Mas eu tenho confiança
que esse Brasil-criança um
dia vai ver
Cada um se eleger
o Operário Patrão
(nhanhanhão, o Operário Patrão)

O Operário Patrão

INTERNACIONAL | TIMOR LESTE CELEBRA VINTE ANOS DE INDEPENDÊNCIA COM AVANÇOS SOCIAIS

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INTERNACIONAL | TIMOR LESTE CELEBRA VINTE ANOS DE INDEPENDÊNCIA COM AVANÇOS SOCIAIS

FPAbramo | Kjeld Jakobsen – No dia 30 de agosto fez vinte anos que a população timorense decidiu em um referendo patrocinado pela ONU que seu país deveria ser uma nação independente. O Timor Leste é uma antiga colônia portuguesa na Ásia que ocupa cerca de metade de uma ilha que a Indonésia considerava integralmente como sua.

Em 1975, após a Revolução dos Cravos em Portugal, este país decidiu desfazer-se do que restava de seu império colonial, o que efetivamente ocorreu nos territórios que dominava na África, no caso, Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe. Porém, quando o mesmo ocorreria no Timor Leste, tropas indonésias ocuparam o território em dezembro de 1975 avaliando que seriam bem recebidas pela população local e que esta ficaria satisfeita em trocar a dominação europeia por uma asiática.

Entretanto, a realidade não foi esta. Os timorenses opuseram-se à ocupação indonésia que durou 24 anos por meio da guerrilha da Frente Revolucionária de Timor Leste Independente (Fretilin) criada em 1974 em oposição à dominação portuguesa e que prosseguiu enfrentando a invasão indonésia como pode. A resistência da população timorense custou a vida de 150 a 200 mil pessoas, quase um terço da população de setecentos mil, fosse pela fome, doenças ou massacres perpetrados pelo exército indonésio. Apesar da condenação pela Assembleia Geral da ONU, a ocupação indonésia foi tolerada pelas grandes potências ocidentais e interpretada como parte da disputa com o bloco socialista.

Quando o ditador Suharto da Indonésia foi deposto e este país minimamente redemocratizado, viabilizou-se uma negociação que levou à convocação do referendo em 1999, auspiciado pela ONU, para a população local decidir seu destino e 78,5% dos timorenses votaram a favor da independência. Não foi uma decisão fácil, pois grupos paramilitares vindos do lado ocidental da ilha do Timor, território indonésio, ameaçaram, agrediram, sequestraram e mataram muitas pessoas para pressionar a população contra a declaração de independência. Cerca de cem mil pessoas foram forçadas a se refugiar do lado ocidental.

A violência extrapolou após o anúncio do resultado com ataques mais graves, bem como a destruição de residências e instalações governamentais levando o Conselho de Segurança da ONU a aprovar uma intervenção militar no Timor Leste, que foi efetivada por tropas da Austrália.

A situação econômica e social do Timor Leste em 1999 era extremamente precária. Em todo o país havia apenas dezenove médicos e a expectativa de vida era inferior a 60 anos. A taxa de desemprego em 2001 era de 9,9% dos trabalhadores formais, absolutamente minoritários no país. O Estado timorense teve que ser construído literalmente das cinzas deixadas pela ocupação e pelos paramilitares. A partir de 2009, foram investidos trinta milhões de dólares em formação universitária para gestores de governo e em 2018 foram definidos os limites marítimos com a Austrália, decisão importante para possibilitar a exploração de petróleo e gás natural no Mar do Timor.

Embora ainda existam pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza e a desnutrição infantil também esteja presente, houve avanços importantes nesses vinte anos. O IDH do Timor Leste o situa como o 132° entre 190 países. Hoje há a presença de aproximadamente mil médicos graças à cooperação cubana e a expectativa de vida é de 69 anos para os homens e 70 anos para as mulheres, em média. Doenças como a lepra deixaram de existir e a malária que era endêmica em 2002, não apresentou nenhum caso em 2018. O desemprego caiu para 3,4% em 2017, embora ainda fosse 11,6% entre os jovens. A taxa anual de homicídios é de 3,9 para cem mil habitantes.

Ou seja, se persistir a mesma disposição que os timorenses tinham no passado para enfrentar a opressão continuar a ser aplicada no desenvolvimento atual, o Timor Leste, apesar de ser um país pequeno e distante dos centros mundiais, tem plenas condições de oferecer uma boa vida para seu povo.

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SNOWDEN: “ESTAMOS NUS DIANTE DO PODER”

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SNOWDEN: “ESTAMOS NUS DIANTE DO PODER”

Livro do homem que revelou o estado de vigilância global sai nesta terça-feira. Ele segue em Moscou; teme que a Inteligência Artificial multiplique o controle; mas crê na resistência cidadã. Vale ler sua entrevista ao “Guardian”.

BLOGDAREDAÇÃO | TECNOLOGIA EM DISPUTA | por Antonio Martins – Há seis anos e meio, Edward Snowden, então um funcionário subcontratado da CIA, entrou num avião em Honolulu, Havaí, e desceu horas depois em Hong Kong. Lá, num quarto de hotel, encontrou-se com os jornalistas Glenn Greenwald, Laura Poitras e Ewen MacAskill – e levantou o véu que encobria o gigantesco aparato de vigilância global montado pelos Estados Unidos. A história de sua vida (apenas 36 anos) está agora contada em livro – Permanent Recordque será lançado em 20 países, na próxima terça-feira (e ainda não tem tradução em português. Na sexta-feira, ele concedeu ao Guardian uma entrevista de duas horas, em que antecipa algumas das revelações.

“Estamos nus diante do poder”, diz Snowden, que vive desde 2014 em Moscou – onde casou-se com Lindsay Mills, sua namorada desde os 22 anos. Tem visto de residência permanente. Viaja bastante, embora não possa sair do país, para não ser agarrado por agentes norte-americanos. Perdeu o medo e o hábito de usar sempre casacos e chapéus. Mas, por temperamento, passa a maior parte do tempo em casa, de onde faz teleconferências que são hoje seu meio de vida. Diz que está preparado para viver longos anos no país e considera natural que Moscou, tão atacada pelo Ocidente, use (discretamente) o fato de lhe ter dado abrigo como propaganda política.

Snowden está preocupado com o avanço da Inteligência Artificial, também no que diz respeito à vigilância. Os dispositivos de reconhecimento facial e de reconhecimento de padrões de comportamento, diz ele, ameaça transformar cada câmera (são dezenas de milhões, pelo mundo), num “policial automático”. Ainda assim, ele não está pessimista. Crê que a consciência da vigilância terminará levando à revolta. “Quem deseja mudar algo precisa por-se de pé”, diz ele. Vê a publicação do livro como algo que pode ajudar esta luta.

Escritas por Glenn Greenwald e Ewen MacAskill, as primeiras matérias sobre a rede global de espionagem dos EUA foram publicadas pelo Guardian e pelo Washignton Post em 6 de Junho de 2013. Estão aqui: 1 2. Dezenas de outras se seguiram e podem ser pesquisadas aquiCitizen Fouro documentário de Laura Poitras que conta a história das revelações, ganhou, em 2015, o Oscar de melhor documentário. Jamais foi exibido comercialmente no Brasil. Outras Palavras orgulha-se de tê-lo apresentado, em cinedebate. Uma vasta entrevista de Laura pode ser lida, em português, aqui.

 

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PREÇOS DO PETRÓLEO DISPARAM APÓS ATAQUE NA ARÁBIA SAUDITA

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PREÇOS DO PETRÓLEO DISPARAM APÓS ATAQUE NA ARÁBIA SAUDITA
Uma plataforma petrolífera de Aramco, neste domingo cerca de Riad. | FAYEZ NURELDINE (AFP)

El País |ÁNGELES ESPINOSA | Dubai

Segundo observadores, o risco será maior se os EUA adotarem represálias contra o Irã

Com a reabertura de alguns mercados finaceiros, os preços do petróleo dispararam entre 15% e 20% após o ataque de drones a duas instalações importantes da petroleira saudita Aramco neste fim de semana. A ação afetou mais da metade da produção de petróleo na Arábia Saudita. Os preços do petróleo crude avançaram mais de oito dólares e chegaram a 63 dólares por barril na noite deste domingo. A alta no preço do brent foi ainda maior. O barril atingiu 71,95 dólares após aumentar quase 12 dólares, um avanço de 19% na abertura do mercado de Cingapura, segundo dados da Bloomberg. Embora os altos funcionários do reino tenham procurado tranquilizar seus clientes, dizendo que o volume vai se recuperar logo, os analistas temem que a volta aos 10 milhões de barris diários extraídos pela estatal Aramco poderia levar semanas ou até meses.

Arábia Saudita é o maior exportador mundial de petróleo, fornecendo cerca de 10% das necessidades globais. Isso significa que o corte de 5,7 milhões de barris diários, segundo dados oficiais, equivale a quase 6% do consumo mundial, o que mostra a envergadura do problema. Javier Blas, correspondente-chefe de Energia da agência Bloomberg, disse no Twitter não se lembrar de uma perda dessa envergadura no volume de petróleo da noite para o dia desde a invasão do Kuwait pelas tropas iraquianas de Saddam Hussein, em 1990.

Tanto o ministro saudita da Energia, o príncipe Abdulaziz bin Salman, como a Agência Internacional de Energia (organismo independente) destacaram a existência de estoques para cobrir os compromissos do reino. De acordo com dados de junho passado, a Arábia Saudita dispõe de 188 milhões de barris armazenados, que serviriam para suprir a demanda do mercado durante semanas. Os Estados Unidos ofereceram suas reservas para garantir o abastecimento mundial.

Segundo o jornal econômico Financial Times, Riad está em contato com vários membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) caso seja necessário aumentar temporariamente a produção até que o reino restabeleça a sua. Existe margem porque, desde o final de 2016, sob impulso saudita, seus membros limitaram o volume de petróleo que sai para o mercado a fim de elevar o preço.

O problema é que não se sabe o alcance real dos danos causados pelos incêndios provocados pelo ataque dos rebeldes houthis do Iêmen. Todas as atenções se voltam à abertura das Bolsas asiáticas nesta segunda-feira. Meia dúzia de analistas consultados pela Reuters concordam, a grosso modo, sobre um aumento inicial de até 10 dólares no preço do barril a partir dos 60 (240 reais) dólares fechados na sexta, podendo chegar aos 100 dólares (400 reais) se o problema não for resolvido no curto prazo (entre um e três meses).

Mas Nick Butler, especialista em política energética internacional citado pela BBC, adverte que o efeito poderia ser breve. “Durante os últimos anos, o mercado se ajustou rapidamente à perda, por motivos políticos, de mais de dois milhões de barris diários da Venezuela e do Irã”, recorda.

A Bolsa de Riad, o maior mercado árabe, abriu neste domingo, primeiro dia da semana do reino, com uma queda de 3%. Mas logo se recuperou para fechar com apenas 1,05% de perda.

A preocupação dos observadores não é tanto o ritmo da volta à produção, mas a possibilidade de que os ataques alimentem as tensões regionais – que poderiam disparar os preços mais a longo prazo. Todas as análises ressaltam o entorno da agressão: a disputa entre os EUA e o Irã. A Arábia Saudita é o principal aliado árabe do presidente norte-americano, Donald Trump, e apoiou sem pestanejar sua política de “máxima pressão” contra os iranianos para obrigá-los a renegociar o acordo nuclear de 2015 e reduzir sua influência no Oriente Médio.

As declarações do secretário de Estado, Mike Pompeo, culpando o Irã do ataque fizeram lembrar que há apenas três meses Trump esteve a ponto de bombardear o país. Uma represália desse tipo teria muito mais impacto sobre o preço do barril e, eventualmente, sobre o que o consumidor paga por um litro de gasolina.

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OPOSIÇÃO E NOMES DO CENTRÃO PRESSIONAM MAIA A INSTALAR CPI DA VAZA JATO

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OPOSIÇÃO E NOMES DO CENTRÃO PRESSIONAM MAIA A INSTALAR CPI DA VAZA JATO
A deputada Jandira Feghali (PC do B). FABIO RODRIGUES POZZEBOM/AGÊNCIA BRASIL

El País | D. Haidar – Deputados da oposição, aliados a nomes de direita e centro-direita do chamado Centrão, obtiveram 175 assinaturas, mais do que as 171 necessárias, para levar adiante uma CPI da Vaza Jato, um escrutínio nos procedimentos da Operação Lava Jato com base nas mensagens de procuradores e do então juiz Sergio Moro reveladas pelo site The Intercept e analisadas em parcerias com outros veículos, entre eles o EL PAÍS. Agora, o grupo pressiona o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), de quem depende o trâmite, a instalá-la.

Procurado pelo EL PAÍS, Maia disse que ainda não leu o texto do requerimento e evitou expressar uma posição sobre o assunto. “CPI precisa de fato determinado. Apenas isso”, informou. De acordo com o requerimento de criação da CPI, o objetivo é investigar “a violação dos princípios constitucionais e do Estado Democrático de Direito, em razão da suposta articulação entre os Membros da Procuradoria da República no Paraná e o então Juiz Sergio Moro da 13ª Vara Federal de Curitiba, tornadas públicas pelo site The Intercept no mês de junho do corrente ano”.

MAIS INFORMAÇÕES

“Eu assinei. A Câmara tem que tomar uma posição em relação a isso. Se tiver apoio da maioria que trabalha ao lado do Rodrigo, e acredito que vai ter, ele não teria nenhum problema em liberar”, disse o deputado Paulinho da Força (Solidariedade) à reportagem.

O líder da Maioria na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP), diz que a instalação da CPI vai ser discutida com Maia em reunião do colégio de líderes partidários. O deputado Orlando Silva (PCdoB), um dos articuladores, diz que houve adesão de parlamentares não só da habitual oposição (PSOL, PDT, PT, PCdoB,PSB), mas também de PP, PMDB, PSD, PTB e Solidariedade. “A oposição sozinha seria incapaz de colher essas assinaturas. Há um desejo de esclarecer os fatos revelados, que são muito graves”, afirmou Silva.

O texto do requerimento da CPI também propõe investigar um conluio entre procuradores da Lava Jato e o ex-juiz Sergio Moro, bem como “supostas ações de irregularidade e de conduta extraprocessual”. Em algumas das reportagens com base nas mensagens, Moro parece repreendendo e aconselhando o procurador Deltan Dallagnol a respeito de passos da investigação, e antecipa decisões que tomará, em uma conduta que, para boa parte dos especialistas, se choca com a previsão de juiz distanciado das partes no direito brasileiro.

A tentativa de instalação da CPI se junta a outras pressões sobre a Operação Lava Jato. O Supremo Tribunal Federal tem várias ações pendentes de julgamento que podem terminar em reveses para a força-tarefa de procuradores. Um dos mais esperados é o que avalia o pedido de suspeição de Moro, feito pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O petista está preso desde abril de 2018 em Curitiba condenado em duas instâncias por corrupção no âmbito da Lava Jato.

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POLÍTICA | PRESSA DO BRASIL EM ENTREGAR BASE DE ALCÂNTARA ESBARRA EM UMA FRAUDE

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POLÍTICA | PRESSA DO BRASIL EM ENTREGAR BASE DE ALCÂNTARA ESBARRA EM UMA FRAUDE

Para a oposição, a política externa brasileira se tornou um instrumento de subordinação do Brasil aos EUA

Carta Capital | ANDRÉ BARROCAL – Jair Bolsonaro e Donald Trump estarão juntos dia 24 na Assembleia Geral anual das Nações Unidas, em Nova York. Por tradição, cabe ao presidente brasileiro (qualquer um) o discurso inaugural e ao americano (idem), o segundo. “Vai ser a pior abertura de uma assembleia da ONU da história”, diz, com melancolia e ironia, um diplomata daqui. Será que até lá Bolsonaro conseguirá liquidar, ao menos entre os deputados, a aprovação de um presente para Trump? Aquele acordo assinado na sua visita à Casa Branca, em março, de aluguel da Base Militar de Alcântara, no Maranhão, para o Tio Sam lançar foguetes e botar satélites no espaço? Um que jogará areia na relação entre o Brasil e a arqui-inimiga de Trump, a China, no setor espacial?

Pressa não falta a Bolsonaro, e quem se encarrega dela na Câmara é seu filho Eduardo, a quem quer nepotisticamente nomear embaixador em Washington. Em 4 de setembro, os deputados aprovaram a proposta de levar o acordo para decisão plenária, sem que mais duas comissões o votem. Só uma comissão examinou o texto, a de Relações Exteriores. Que é presidida por Eduardo. Este, aliás, acaba de salvar o pai na comissão ao impedir que o empresário Alexandre Giordano fosse chamado a depor sobre o caso Itaipu, ameaça de impeachment no Paraguai. Articulada pelo “zero três”, a proposta de urgência triunfou por 330 a 98 votos. E olha que na véspera havia surgido uma Frente Popular e Parlamentar em Defesa da Soberania Nacional e Contra as Privatizações, cujo manifesto dizia: “O atual governo, ultraliberal e autoritário, transformou nossa política externa em instrumento de total subordinação a outros interesses estrangeiros, como ficou patente no acordo firmado com os Estados Unidos para utilização da Base de Alcântara e no acordo Mercosul-União Europeia”.

A “total subordinação” a Washington está nas “salvaguardas políticas” dentro de um acordo que deveria ser apenas de “salvaguardas tecnológicas”. Para proteger a tecnologia de bisbilhoteiros, o Brasil aceita várias condições. Só pessoas portadoras de crachás emitidas pelos EUA circularão em Alcântara. Em caso de acidentes, serão feitas fotos para investigar as causas somente se os EUA deixarem e apenas haverá informações dos americanos se isso não afetar seus “interesses nacionais de segurança e de política externa”. São exemplos de “salvaguardas tecnológicas”, uma rotina em acordos do gênero.

Outras cláusulas são puramente políticas, limitadoras da ação externa e do programa espacial brasileiros. Não só não haverá transferência de tecnologia americana de foguetes, como o Brasil não poderá usar o dinheiro do aluguel de Alcântara para aprender a fazer foguete. Os EUA têm uma política deliberada e antiga de impedir que o Brasil possua foguetes, vide um telegrama de 2009 vazado em 2011 pelo WikiLeaks. Era uma orientação do Itamaraty do Tio Sam à embaixada americana em Brasília sobre como lidar com a Ucrânia, que tinha então um acordo na esfera espacial com o Brasil. “Queremos lembrar às autoridades ucranianas”, diz o texto, “que os EUA não se opõem ao estabelecimento de uma plataforma de lançamentos em Alcântara, contanto que tal atividade não resulte na transferência de tecnologias de foguetes ao Brasil”. Motivo: “Devido à nossa política, de longa data, de não encorajar o programa de foguetes espaciais do Brasil”.

O acordo restringe as opções para quem o Brasil também poderá alugar a base. Só as nações do Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis. O MTCR, na sigla em inglês, é um tratado global para conter a proliferação de armas de destruição em massa. Um grupo de 35 países. O que significa que uns 160 estão fora. Entre eles, a China, com quem o Brasil há 30 anos possui uma parceria para desenvolvimento de satélites. É com o satélite sino-brasileiro, o Cbers, que se monitora o desmatamento na Amazônia. Uma nova versão do Cbers, a 4A, está em testes e deverá ser lançada em dezembro da China. Os lançamentos têm sido feitos de lá desde sempre e, graças ao acordo com os EUA, jamais poderão ser de Alcântara.


EDUARDO BOLSONARO SERÁ PREMIADO POR SUA RECEITA DE HAMBÚRGUER

Nação que tiver levado sanção da ONU ou for “terrorista” também não poderá usar a base, por imposição do Tio Sam. Regra sob medida contra o Irã, na lista americana dos “terroristas”. O acordo diz ainda que seus termos deverão ser repetidos em outros que o Brasil sele sobre Alcântara. “Os Estados Unidos não precisam de base, já têm na Flórida. A questão central para eles é anular a base brasileira como instrumento de um programa espacial nosso”, diz Roberto Amaral, de 79 anos, ministro da Ciência e Tecnologia em 2003 e ex-diretor de uma empresa binacional Brasil-Ucrânia montada em 2007 para desenvolver foguetes em Alcântara. O Brasil tem base e sabe fazer satélite, falta dominar a fabricação de foguetes. E por que é útil um programa espacial completo? “A vigilância física do território, o tráfego aéreo, o desmatamento da Amazônia, nossa fronteira atlântica, onde está o pré-sal, as comunicações, tudo isso é controlado por satélite. Se nós não temos satélite, o dono de quem alugamos sabe tudo antes de nós”, afirma Amaral.


A FRENTE POPULAR DENUNCIA: “NOSSA POLÍTICA EXTERNA TORNOU-SE UM INSTRUMENTO DE TOTAL SUBORDINAÇÃO”

Bem relacionado com militares, o deputado paulista Carlos Zarattini, de 60 anos e do PT, aponta uma preocupação geopolítica no acordo com os EUA. Devido às salvaguardas tecnológicas, o Brasil não poderá inspecionar nada do que os Estados Unidos levarem à base. “Se eles lançarem um satélite para espionar a Venezuela, nós não vamos saber. Estamos servindo de ponta de lança militar para os americanos, vamos lembrar que há um general nosso no Comando Sul das forças americanas (Alcides Valeriano de Faria Júnior, de 52 anos, assumiu este ano um posto lá).” Na terça-feira 10, Trump demitiu John Bolton, um de seus principais assessores de segurança nacional, aparentemente porque Bolton errou ao garantir que Nicolás Maduro seria derrubado na Venezuela. Um dia após a demissão, a Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovou o uso de um mecanismo, o Tiar, que na prática endurecerá o isolamento político, comercial e diplomático da Venezuela, maior reserva de petróleo do mundo.

Roberto Amaral: “Se nós não temos satélite, o dono de quem alugamos sabe tudo antes da gente”

Em defesa do acordo com os EUA, o bolsonarismo afirma que o Brasil terá lucro ao dar uso comercial à base mais bem localizada no planeta para botar satélites no espaço. Como Alcântara fica perto da linha do Equador, dali um foguete consegue colocar um satélite em órbita com uns 30% menos combustível. Se tal acordo tivesse vingado em 2001, quando proposto por Fernando Henrique Cardoso, o Brasil teria embolsado 3,9 bilhões de dólares, diz o bolsonarismo. Diz mais: que o País ganhará 10 bilhões de dólares anuais a partir de 2040, quando o mercado de lançamento de satélites passar dos atuais 350 bilhões para 1 trilhão ao ano. O ganho será de 1 bilhão de reais por ano tão logo o acerto vigore, segundo o relator do acordo na Câmara, o deputado maranhense Hildo Rocha, de 59 anos e do PMDB. Será? A estimativa era de 35 milhões em 2001.

O que mobiliza as Forças Armadas é hoje a aprovação da lei que aumenta o salário, sobretudo das altas patentes

Com tanta grana jorrando, diz o governo, Alcântara se tornará uma nova Kourou, base em cidade homônima da Guiana Francesa. É a plataforma mais ativa do mundo, responsável por cerca de 17% do PIB da Guiana. Ali fica a Agência Espacial Europeia. Todos os satélites europeus vão ao espaço dali: equipamentos destinados ao estudo de biomas, aglomerações urbanas, hidrografia. Em junho, o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, e uma comitiva de parlamentares foram conhecer a cidade. “Lá não existe pobre, porque lá se desenvolveram hotéis, centros de convenção, visitas periódicas à base”, afirmou Eduardo Bolsonaro na votação da urgência. (Faltou dizer que a antiga metrópole, a França, bota dinheiro na ex-colônia explorada). A propósito: seu irmão Carlos Bolsonaro acaba de mostrar no Twitter o risco ditatorial representado pelo clã: “Por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos”.


CIRO GOMES: “MILITARES CÚMPLICES, VENDILHÕES DA PÁTRIA”

“Estão causando uma grande expectativa, e a frustração vai ser muito maior, porque fazer uma comparação com a base de Kourou não é pertinente. Lá é a base de lançamento de satélites de toda a Europa”, diz o líder do PDT na Câmara, o cearense André Figueiredo, de 52 anos, que fez parte da comitiva de junho. Dias depois da viagem, ele participou de uma reunião com Pontes no gabinete do líder pedetista no Senado, Weverton Rocha, que é do Maranhão. Na conversa, conta Figueiredo, o ministro deixou claro: ao menos uma das empresas do Tio Sam em condições de usar Alcântara, a Spacex, diz que não investirá nada ali. Às vésperas do 7 de Setembro, Ciro Gomes, presidenciável do PDT em 2018, listou nove “entreguismos” do governo Bolsonaro e o primeiro da fila era a Base de Alcântara: “E os militares cúmplices. Vendilhões da pátria”.

O que mobiliza as Forças Armadas neste momento é a aprovação da lei que aumenta o salário nos quartéis, sobretudo da alta oficialidade. O chefe do Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro, o general de pijama Augusto Heleno, do GSI, disse em julho, na Câmara, que tem “vergonha” de ganhar, líquidos, 19 mil reais mensais. De 2011 a 2017, embolsou mais de 50 mil por mês como diretor do Comitê Olímpico Brasileiro, cargo para o qual havia sido convidado por Carlos Arthur Nuzman, cuja prisão por corrupção motivou a saída de Heleno do COB.

Carlos Bolsonaro adverte: por vias democráticas, a transformação será muito lenta

André Figueiredo promete voto contra de sua bancada ao acordo, mas, na decisão sobre a urgência, 8 de 21 pedetistas apoiaram a pressa. A oposição rachou no assunto “Base de Alcântara”. Na votação na Comissão de Relações Exteriores, em 21 de agosto, PCdoB e PSB disseram “sim” ao acordo, PT e PSOL, “não”. Boa parte da explicação para o racha está no governador do Maranhão. Flávio Dino, de 51 anos, do PCdoB. Dino apoia o acordo, de forma discreta. Sente-se sem condições de criticar algo que no Maranhão todos acham que será bom. O prefeito de Alcântara, Anderson Wilker, é do PCdoB.

Quando chegar a hora da verdade no plenário, o PCdoB votará a favor do acordo; PT, PSOL e PDT, contra. O PSB vai se dividir, afirma o líder da legenda, o pernambucano Tadeu Alencar, de 56 anos. O único deputado do PSB maranhense, Bira do Pindaré, coordena a Frente Parlamentar Quilombola e tem críticas ao acordo, por causa dos quilombolas, mas votará a favor. Alcântara, cidade de 21 mil pessoas das quais 56% vivem com até meio salário mínimo, segundo o IBGE, foi habitada pelos Tupinambá. Segundo Pindaré, a base tem 8 mil hectares e os EUA, com o acordo, terão mais 12 mil, o que representará o deslocamento forçado de mais de 2 mil maranhenses quilombolas.


CHINAGLIA: “FOMOS ENGANADOS NA COMISSÃO”. ASSIM SE CONSUMOU A FRAUDE

Foi por causa dos quilombolas que o PSOL entrou com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para barrar a votação. A deputada mineira Áurea Carolina, de 35 anos, diz que o acordo viola a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Pela convenção, sempre deve haver consulta prévia a comunidades tradicionais antes de aprovada uma lei que mexa com a vida delas. O mandado caiu com o juiz Alexandre de Moraes, que pediu explicações ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, do DEM, até o dia 13.

Maia está numa sinuca. O petista Arlindo Chinaglia, um dos deputados mais atuantes contra o acordo, apontou a ocorrência de uma “fraude” na tramitação do texto. E espera uma resposta do chefe da Câmara. Segundo Chinaglia, o acordo votado na Comissão de Relações Exteriores estava incompleto. Faltava um anexo com a orientação operacional para a polícia e o socorro emergencial atuarem em Alcântara. Os deputados souberam do anexo pelo ministro Pontes. Acionado por Eduardo Bolsonaro, o comandante da comissão, o governo enviou o anexo através do Itamaraty. Deveria ter sido via Presidência, como a íntegra do acordo. “Fomos enganados na comissão. É de muita gravidade, visto que houve uma fraude. Ficou parecendo que o presidente teria enviado a matéria, e não a enviou”, diz Chinaglia.


ZARATTINI: “SE ELES LANÇAREM UM SATÉLITE PARA ESPIONAR A VENEZUELA, NÓS NÃO SABEREMOS”

Médico de 69 anos, o petista é um dos deputados mais experientes da Casa, está no sétimo mandato e acompanhou de perto o fracasso do governo FHC na tentativa de aprovar o mesmo acordo com os EUA, em 2001. Agora não tem ilusões: “Aqui ninguém sabe o que está votando nesse acordo nem dá bola para a soberania nacional”.

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CEM MINUTOS NA PRISÃO COM LULA

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CEM MINUTOS NA PRISÃO COM LULA

Carta Maior | Por Ignacio Ramonet – Você vai entrar agora no pequeno espaço em que Lula está preso. Ignacio Ramonet vai conduzi-lo pela mais fotográfica e intimista visita à cela onde a principal liderança do país vive apartada do povo que o elegeria em 2018 para um terceiro mandato presidencial.

O ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, preso na cidade de Curitiba, no sul do país, só pode receber duas visitas por semana. Uma hora. Nas quintas pela tarde, entre quatro e cinco horas. Tenho que esperar minha vez. E a lista de quem pode vê-lo é longa… Mas hoje, dia 12 de setembro, estamos aqui eu e Adolfo Pérez Esquivel, um vencedor do Prêmio Nobel da Paz.

Lula está na prisão, cumprindo pena de 12 anos e 1 mês “por corrupção passiva e lavagem de dinheiro”, mas sem ter sido condenado definitivamente (ainda pode apelar) e apesar de seus acusadores não terem comprovado sua culpa. Tudo é uma farsa, como é possível ver nas demolidoras revelações do The Intercept, meio digital investigativo, dirigido por Glenn Greenwald. Lula foi vítima da arbitrariedade mais absoluta. Uma trama jurídica totalmente manipulada, destinada a arruinar sua popularidade e eliminá-lo da vida política, a assassiná-lo midiaticamente. Impedindo, desse modo que pudesse se apresentar e ganhar as eleições presidenciais de 2018. Uma espécie de “golpe de Estado preventivo”.

Além de ser julgado de forma absolutamente arbitrária e indecente, Lula foi linchado permanentemente pelos grandes grupos midiáticos dominantes – especialmente a Rede Globo –, a serviço dos interesses dos maiores empresários, com um ódio feroz e revanchista contra o melhor presidente da história do Brasil, que tirou da pobreza a quarenta milhões de brasileiros, e criou o programa Fome Zero… Não o perdoam… Quando faleceu seu irmão mais velho e mais próximo, Genival “Vavá” da Silva, não o deixaram ir ao enterro, apesar de ser um direito garantido pela lei. E quando seu netinho Arthur, de 7 anos, morreu de meningite, o seu preferido, só permitiram a ele estar uma hora e meia no velório. Humilhações, vexações, vinganças miseráveis…

Antes de ir à prisão – situada a sete quilômetros do centro de Curitiba –, nos reunimos com um grupo de pessoas próximas ao ex-presidente, para que nos expliquem o contexto.

Roberto Baggio, dirigente local do Movimento dos Sem Terra (MST), nos conta como se organizou a mobilização permanente que chamam de “Vigília”. Centenas de pessoas do grande movimento Lula Livre. Acampam em frente ao edifício da carceragem, organizando reuniões, debates, conferências, concertos… E três vezes por dia – às 9h, a às 14h30 e às 19h –, lançam a todo pulmão um sonoro “bom dia!”, “boa tarde!”, “boa noite, Presidente Lula”… segundo eles, “para que Lula nos ouça, para dar ânimo”, nos diz Baggio, “e para levar a ele a voz do povo… no começo, pensávamos que isso duraria cinco ou seis dias e que o Supremo Tribunal Federal (STF) o colocaria em liberdade… mas agora estamos organizados para um protesto popular prolongada…”.

Carlos Luiz Rocha é um dos advogados de Lula. Ele o visita quase todos os dias e nos conta que a equipe jurídica do ex-presidente questiona a imparcialidade do juiz Sérgio Moro – recompensado por Jair Bolsonaro com o Ministério da Justiça – e dos procuradores… “O The Intercept demostrou que Deltan Dallagnol, o procurador-chefe, confirmou pessoalmente que `no caso de Lula, a questão jurídica é pura filigrana… o problema é político´”.

Rocha é relativamente otimista, porque, segundo ele, a partir do próximo 20 de setembro, Lula já terá cumprido parte da pena suficiente para poder obter prisão domiciliar. “Há outro elemento importante, enquanto a popularidade do Bolsonaro está em queda fortemente, as pesquisas mostram que a de Lula volta a subir… atualmente, já são mais de 53% os cidadãos que pensam que Lula é inocente. A pressão social vai sendo cada vez mais intensa a nosso favor”.

Juntou-se a nós a amiga Mônica Valente, secretaria de relações internacionais do Partido dos Trabalhadores (PT) e secretária-geral do Foro de São Paulo.

Entre amigos, caminhamos na direção do edifício, onde Lula está preso. A visita está marcada para as 16h. Mas antes passamos pela Vigília, para cumprimentar as pessoas ali acampadas, e depois nos preparamos para as formalidades de entrada ao edifício carcerário. Não é uma prisão qualquer, mas sim a sede administrativa da Polícia Federal, que improvisou um local que serve de cela.

Só quatro pessoas podem entrar para ver Lula: Adolfo Pérez Esquivel e eu, acompanhados pelo advogado Carlos Luiz Rocha e Mônica Valente. O recepcionista é cordial, mas sem deixar de ser muito rígido. Ele confisca temporariamente os nossos telefones e nos faz uma minuciosa vistoria eletrônica. Só é permitido levar até o réu livros e cartas, e por sorte, porque Adolfo trouxe a ele 15 mil cartas de admiradores em um pendrive, que foi confiscado para verificação, e logo devolvido.

Lula está no quarto andar do edifício. Não o veremos em uma sala especial para visitas, e sim na própria cela, onde está preso. Subimos por um elevador até o terceiro andar, e de lá seguimos pelas escadas. No final do corredor, à esquerda, está a porta. Um guarda armado está sentado ao lado, e é quem nos abre. Nada disso se assemelha a uma prisão, exceto os guardiães. Parece um local administrativo e anônimo, cheio de escritórios. O carcereiro-chefe Jorge Chastalo (está escrito em sua camiseta), um sujeito alto, forte, loiro e olhos verde-azuis, com os antebraços tatuados, foi quem nos acompanhou. Um homem amável e construtivo, quem tem, suponho, relações cordiais com seu prisioneiro.

A habitação-cela é retangular. Entramos por um dos lados pequenos e a vemos em toda a sua profundidade. Como estamos sem os telefones, não posso tirar fotos, então tento fotografar mentalmente tudo o que observo. Tem uns seis ou sete metros de comprimento e uns três e meio de largura, o que seria um total de 22 metros quadrados de superfície. Ao lado direito, ao entrar, está o banheiro com chuveiro e privada, em um quarto específico. No fundo da cela há duas janelas quadrada com grades horizontais de metal pintadas de branco. Uns toldos de cor cinza prateado entrar a luz natural do dia, mas impedem ver o exterior. No ângulo esquerdo do fundo da cela está a cama individual, coberta com um edredom negro e um tapetinho no chão. Sobre a cama, pregadas na parede, cinco grandes fotografias coloridas do pequeno Arthur, recém falecido, e dos outros netos de Lula com seus pais. Ao lado, à direita, debaixo de uma das janelas, há uma mesinha de madeira clara, de estilo dos Anos 50, com duas gavetas vermelhas, sobrepostas. Aos pés da cama, um móvel também de madeira, que serve de suporte a um pequeno televisor negro de tela plana, com 32 polegadas. Ao lado dele, também contra a parede esquerda, há uma mesinha baixinha com uma cafeteira para fazer café. Ao lado desta, outro móvel quadrado e mais alto, que serve de suporte a uma jarra d´água e um galão de cor verde esmeralda, como as que se vê em alguns escritórios. A marca da água é Prata da Serra.

Em outro ângulo do fundo, à direita, há uma pequena academia de ginástica, com um banco coberto de falso couro negro, para exercícios, elásticos para musculação e uma grande caminhadora. Ao lado, entre a cama e a máquina de exercícios, um pequeno aquecedor elétrico sobre rodas. No alto da parede do fundo, sobre as janelas, há um ar condicionado branco.

No meio da habitação, uma mesa quadrada de 1,20 de lado, coberta com um pano de cores celeste e branco, e quatro cadeiras confortáveis, com descansos para os braços, de cor negra. Um quinto assento, uma poltrona, está disponível contra a parede direita. Finalmente, perto da parede que separa o quarto do banheiro, há um armário grande, de três colunas, mesclando cores branco e roble claro, e uma pequena estante ao lado direito, que serve de biblioteca.

Tudo era muito modesto e austero, até um pouco espartano para um homem que foi, durante oito anos, o presidente de uma das dez principais potências do mundo… mas tudo muito ordenado, bem limpo e organizado…

Com seu carinho de sempre, com um caloroso abraço e palavras genuínas de amizade e afeto, Lula nos acolhe com sua voz característica, rouca e potente. Veste uma camiseta do Corinthians, o time de futebol para o qual ele torce, uma calça cinza clarinha e uns chinelos tipo havaianas. Parece estar muito bem de saúde, robusto, forte: “caminho nove quilômetros diários”, diz ele. E em excelente estado psicológico: “estamos à espera de tempos melhores, por isso não estou pessimista, e nunca fui um depressivo, jamais, desde que nasci, e por isso não posso ser agora”, afirma.

Nos sentamos em torno da mesinha, ele diante da porta, de costas para a janela, Adolfo à sua direita, Mônica em frente, o advogado Rocha um pouco mais agastado, entre Adolfo e Mônica, e eu fico à sua esquerda. Sobre a mesa, há quatro estojos com de lápis de cores e canetas.

Entrego a ele os dois livros que trouxe, as edições brasileiras de “Cem horas com Fidel” e “Hugo Chávez, minha primeira vida”. Ele brinca sobre sua própria biografia, que está sendo escrita já há alguns anos, pelo nosso amigo Fernando Morais: “não sei quando ele a terminará… tudo começou quando eu deixei a Presidência, em janeiro de 2011. Alguns dias depois, fui a um encontro com os catadores de reciclados de São Paulo… estávamos debaixo de uma ponte, e ali havia uma menina que se aproximou e me perguntou se eu sabia o que tinha feito a favor dos catadores… aquilo me surpreendeu, e disse que, bom, tínhamos feito programas sociais em educação e saúde, em moradia, etc… e ela me disse `não, nada disso, o que você nos deu foi outra coisa: dignidade´… ¡uma menina! Eu fiquei impressionado, e comovido… e comentei com Fernando: “olha, seria bom fazer um livro com o que o povo pensa do que fizemos no governo, o que pensam os funcionários, os comerciantes, os empresários, os trabalhadores, os camponeses, os professores… perguntando a eles, reunindo as respostas… Fazer um livro não com o que eu posso contar da minha Presidência, mas sim com o que o próprio povo diz… esse era o projeto… (ele ri) mas o Fernando se lançou em uma missão titânica porque quer ser exaustivo… só escreveu sobre o período 1980-2002, ou seja, antes de eu chegar à Presidência… e já é um tom colossal… porque nesse período de 22 anos ocorreram tantas cosas… fundamos a CUT (Central Única dos Trabalhadores), o PT, o MST, lançamos as campanhas pelas Diretas já!, e a favor da Constituinte… transformamos o país… o PT se tornou o maior partido do Brasil… e devo lembrar que ainda hoje, neste país, só existe um partido verdadeiramente organizado, que é o nosso, o PT”.

Perguntamos sobre seu estado de Ânimo. Ele lembra que “hoje cumpri 522 dias desde a minha entrada nesta prisão, naquele sábado 7 de abril de 2018… e exatamente ontem, se cumpriu um ano do dia em que tive que tomar a decisão mais difícil, escrever a carta na que renunciei a ser candidato às eleições presidenciais… estava nesta cela, sozinho, e com uma dúvida, porque sentia que estava cedendo aos desejos dos meus adversários… impedir minha candidatura… foi um momento duro, dos mais duros da minha vida… e eu aqui, completamente só… e pensava `isso é como dar à luz com muita dor e sem ninguém que segure a sua mão´”.

Ele abre o livro “Cem horas com Fidel” e me diz: “Conheci o Fidel em 1985, exatamente em meados de julho de 1985… estava em Havana pela primeira vez, participando da Conferência Sindical dos Trabalhadores da América Latina e do Caribe sobre a Dívida Externa… eu já havia saído da CUT, já não era sindicalista, meu tempo estava todo dedicado a ser secretário-geral do PT e era candidato para as eleições legislativas do ano seguinte… mas não havia só sindicalistas nessa Conferência, porque Fidel também convidou intelectuais, professores, economistas e dirigentes políticos. Lembro que era mais ou menos às 17h, no Palácio do Congresso, Fidel presidia a sessão e aquilo estava muito monótono, então ele fez algo que me surpreendeu, porque não nos conhecíamos pessoalmente, e ele me mandou uma mensagem por um bilhetinho, perguntando se eu iria falar, e eu respondi que não, pois não estava previsto. Então, ele me enviou outro bilhete, quase dando uma ordem: `você tem que falar, e será o último, vamos encerrar com você´… mas a CUT não queria de nenhuma forma que eu tomasse a palavra… então eu não sabia o que fazer… nisso, era já 19h, e da presidência da mesa, surpreendentemente, o Fidel anuncia que eu tenho a palavra… então me vi obrigado a toma-la, me levantei e fui à tribuna… e comecei a falar, sem tradução… fiz um longo discurso, e terminei dizendo `companheiro Fidel, quero dizer aos amigos e amigas aqui reunidos que os Estados Unidos tentam por todos os meios nos convencer de que são invencíveis, mas Cuba já os venceu, o Vietnã já os venceu, a Nicarágua já os venceu, e El Salvador também os vencerá… não temos que ter medo deles!´… houve fortes aplausos. Bom, termina a jornada e eu vou à casa onde estava hospedado, no Laguito… e quando chego, quem estava esperando na entradinha da casa? Fidel e Raúl! Os dois estavam lá sentados me aguardando… Fidel começou a perguntar onde eu havia aprendido a falar assim, e então eu contei sobre a minha vida… e assim foi como nos tornamos amigos para sempre”.

E Lula acrescenta: “devo dizer que Fidel sempre foi muito respeitador, nunca me deu um conselho que não fosse realista. Nunca me pediu para fazer loucuras. Uma pessoa prudente, moderada, um sábio, um gênio”.

Lula então perguntou a Pérez Esquivel, que preside o comitê internacional a favor do Prêmio Nobel da Paz ao ex-presidente brasileiro, como avança esse projeto. Adolfo dá os detalhes do grande movimento mundial de apoio a essa candidatura, e diz que o premio costuma der anunciado, em geral, no começo de outubro, ou seja, dentro de menos de um mês… e segundo suas fontes este ano será para uma figura da América Latina, e mostrou que está otimista.

Lula insiste em que é decisivo o apoio da Alta Comissária para os Direitos Humanos das Nações Unidas, a chilena Michelle Bachelet. Ele diz que essa é a “batalha mais importante”. Mas não a vê fácil. Então, nos conta uma anedota: “há alguns anos, quando eu já tinha saído da Presidência, me propuseram ao Prêmio Nobel da Paz. Um dia, me encontrei com a rainha consorte da Suécia, Silvia, esposa do rei Carlos XVI Gustavo. Ela é filha de uma brasileira, Alice Soares de Toledo, então falamos mais à vontade. E ela me disse: `enquanto você for amigo do Chávez, não creio que isso possa avançar muito… se afaste do Chávez e terá o Prêmio Nobel da Paz´, assim são as coisas”.

Eu pergunto a ele o que acha destes primeiros oito meses de governo de Jair Bolsonaro. “O Bolsonaro está entregando o país”, responde ele. “Eu estou convencido de que tudo o que está ocorrendo está baseado na tomada da tomada da Petrobras pelos interesses estrangeiros… por causa da enorme jazida de petróleo do Pré-Sal, o maior do mundo, com reservas fabulosas, de qualidade altíssima, descoberto em 2006, em nossas águas territoriais, embora esteja em grandes profundidades, a mais de seis mil metros, sua riqueza é de tal dimensão que justifica tudo… poderia lembrar também que a reativação da Quarta Frota, por Washington, que patrulha toda a costa atlântica da América do Sul, foi decidida quando o Pré-Sal foi descoberto. Por isso, nós, junto com a Argentina, a Venezuela, o Uruguai, o Equador, a Bolívia, etc… criamos o Conselho de Segurança da Unasul (União das Nações Sul-Americanas)… é um elemento determinante”.


“O Brasil – prossegue Lula – sempre foi um país dominado pelas elites, voluntariamente submetidas pelos Estados Unidos… só quando nós chegamos ao poder, em 2003, o Brasil começou a ser protagonista… entramos no G20, fundamos os BRICS (com Rússia, Índia, China e África do Sul), organizamos os Jogos Olímpicos em um país emergente pela primeira vez, e também uma Copa do Mundo de futebol… nunca houve tanta integração regional na América Latina… por exemplo, nosso comércio com outros países do Mercosul era de 15 bilhões de dólares, e quando terminei meus dois mandatos esse número saltou para 50 bilhões… até com a Argentina, quando cheguei nós tínhamos cerca de 7 bilhões em comércio, e passamos a 35 bilhões… os Estados Unidos não querem que sejamos protagonistas, que tenhamos soberania econômica, financeira, política, industrial e menos ainda militar. Não querem, por exemplo, que o Brasil assine um acordo com a França para um submarino nuclear. Nós avançamos nesse sentido com o presidente François Hollande, e o Bolsonaro reverteu a decisão. Até essa miserável declaração, tão espantosamente antifeminista, contra a Brigitte, esposa do presidente Emmanuel Macron, é preciso que situemos nesse contexto”.

O tempo da visita está terminando. Falamos de muitos dos seus amigos e amigas que exercem ainda mais responsabilidades políticas de muito alto nível em diversos países ou em organizações internacionais. Nos pede que transmitamos a todas e todos seu abraço mais afetuoso, e agradece sua solidariedade.

Insiste em contar o seguinte: “digam que estou bem, como vocês podem constatar. Sou consciente de porque estou preso. Sei muito bem. Não ignoro a quantidade de processos que há contra mim. Não creio que eles me soltem. Se o STF me declara inocente, já há outros preparados para que eu nunca saia daqui. Não me querem livre para não correr nenhum risco… isso não me dá medo… estou preparado para ter paciência… e dentro do que cabe, tenho sorte… se isto fosse há cem anos, já teriam me enforcado, ou fuzilado, ou esquartejado… para dar o exemplo do que se faz com qualquer forma de rebeldia… tenho consciência do meu papel… não vou abdicar… sei da minha responsabilidade com o povo brasileiro… estou preso, mas não me queixo, me sinto mais livre que milhões de brasileiros que não comem, não trabalham e não têm casa… parece que estão livres, mas estão presos em sua condição social, da qual não podem fugir…

Prefiro estar aqui sendo inocente, que fora sendo um culpado… a todos os que acreditam na minha inocência, eu digo: não me defendam só com a fé cega… leiam as revelações do The Intercept. Lá está tudo, argumentado, provado, demonstrado. Defendam-me com argumentos… elaborem uma narrativa, um relato… quem não elabora uma narrativa, no mundo de hoje, perde a guerra.

Estou convencido de que os juízes e os procuradores que montaram a manipulação para me prender não dormem com a tranquilidade que eu tenho. São eles os não têm a consciência tranquila. Eu sou inocente. Mas não vou ficar de braços cruzados. O que vale é a luta”.

*Publicado originalmente em nodal.am | Tradução de Victor Farinelli

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ORIENTAÇÃO NA COMISSÃO DE ANISTIA É NEGAR PEDIDOS EM MASSA, DIZ CONSELHEIRO DO ÓRGÃO

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ORIENTAÇÃO NA COMISSÃO DE ANISTIA É NEGAR PEDIDOS EM MASSA, DIZ CONSELHEIRO DO ÓRGÃO

Folha Uol | Ricardo Della Coletta – Único representante dos anistiados na Comissão de Anistia, órgão responsável por analisar os pedidos de reparação de perseguidos pela ditadura, o advogado Victor Neiva afirma que há “cinismo” no colegiado e que o órgão está orientado a negar em massa as solicitações.

Neiva também acusa o ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, comandado por Damares Alves, de lançar mão de uma manobra jurídica para tentar removê-lo da Comissão de Anistia.

A pasta baixou no início de setembro uma norma que proíbe que os conselheiros da Comissão advoguem na Justiça em processos que envolvem anistiados, sob o argumento de que isso configura conflito de interesse.

O ministério estabeleceu que os conselheiros ou abram mão das ações judiciais nas quais advogam ou deixem a Comissão de Anistia, uma manobra que entidades que representam os anistiados dizem ser direcionada para atingir o advogado.

Neiva afirma que, ao ser indicado como conselheiro da Comissão de Anistia, renunciou aos casos em que representava anistiados no próprio colegiado. Mas ele atua há cerca 20 anos advogando em processos sobre a anistia na Justiça.

“Eu estou dando trabalho para eles, contra um objetivo que existe lá de revisionismo histórico. E isso motivou a tentativa de me tirar do órgão”, afirmou o advogado em entrevista à Folha.

“Não há espaço para convencimento racional na Comissão de Anistia, que está voltada para a visão do indeferimento [dos pedidos]. Quando a jurisprudência é contrária aos anistiados, eles a citam para indeferir. Quando ela é favorável aos anistiados, eles esquecem a jurisprudência e indeferem mesmo assim. Isso não é direito, é cinismo em juridiquês”, reclama Neiva.

Formada por 27 conselheiros, a Comissão de Anistia elabora pareceres de caráter consultivo. Cabe à ministra Damares decidir se defere ou indefere as solicitações de reparação econômica.

Segundo dados do ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em 2019 a Comissão de Anistia analisou 80 processos. Destes, Damares negou 74 pedidos e deferiu parcialmente seis.

As entidades de representação dos anistiados podem designar um representante para a Comissão de Anistia. Os demais nomes são escolhidos pelo governo.

Desde que assumiu o ministério, Damares tem prometido rever reparações dadas nos últimos anos e abrir o que chamou de “caixinhas” da comissão.

Ela indicou como presidente do colegiado o advogado João Henrique Nascimento de Freitas, ex-assessor do então deputado estadual Flávio Bolsonaro.

Freitas foi responsável por ajuizar, em 2010, uma ação na Justiça Federal do Rio contra o pagamento de indenização a camponeses reconhecidos como vítimas de tortura durante as operações do Exército para acabar com a Guerrilha do Araguaia.

O atual presidente da Comissão da Anistia também entrou com ação contra o reconhecimento do guerrilheiro e militar Carlos Lamarca (1937-1971) como anistiado.

“Ele entra com uma ação para anular as anistias dos guerrilheiros do Araguaia, mas se sente na condição de julgar esses casos. Aí não tem conflito de interesse nenhum e no meu caso tem?”, protesta Neiva.

O advogado afirma ainda que a Comissão de Anistia tem recusado requerimentos utilizando o argumento de que não há provas para a concessão do benefício, mesmo em casos em que há material probatório.

“Uma vez a assessoria [da comissão] me mandou um caso com um parecer pré-pronto que dizia não ter prova. O requerente havia dito que tinha sido anistiado pelo estado, mas a assessoria dizia que isso não constava dos autos. Aí eu fui ver e tinha a cópia inteira do processo. Até quando tem provas, eles negam que ela exista. E vai passando o rolo compressor”, argumenta.

Neiva diz que, embora seja minoria no colegiado, sua atuação incomoda o ministério porque ele apresenta um “contraponto” à opinião manifestada pela cúpula da comissão.

“A gente fez um planejamento estratégico, considerando o que é possível fazer quando se é o único em um colegiado hostil. Você pode a rigor denunciar as ilegalidades. Quando um julgamento que deixa de ser unânime, é possível estabelecer um contraponto. Dá para atuar para que processos que são mal instruídos e que estão sendo sufocados sejam, no mínimo, melhor instruídos”, conclui.

Procurado, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos nega que o objetivo da norma sobre conflito de interesse seja alijar o representante dos anistiados do órgão.

“Desde a nomeação dos conselheiros, o presidente da Comissão de Anistia e demais integrantes se preocupam com o respeito aos princípios constitucionais da legalidade, da moralidade e, ainda, da impessoalidade”, disse a pasta.

O ministério também defende  que a atuação passada do presidente da comissão em casos sobre a anistia não configura conflito de interesse.

“O ajuizamento de ações populares pelo atual presidente visava submeter ao Judiciário a legalidade dos atos administrativos proferidos pela Comissão de Anistia à época. A ação popular envolvendo os atos administrativos que beneficiavam camponeses do Araguaia buscava, exclusivamente, a proteção do erário público, de forma que fosse evitada sua dilapidação por meio de decisões que não continham, a priori, os requisitos exigíveis para sua concessão”, afirma a pasta.