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Diretora do presídio pode responder administrativamente e criminalmente por benefícios concedidos ao criminoso / Foto: Divulgação.
De acordo com denúncias, Taradão utiliza a lanchonete da unidade para lucrar, vendendo itens superfaturados aos presos
Igor Carvalho | Brasil de Fato | São Paulo (SP) – Regivaldo Pereira Galvão, o Taradão, mandante do assassinato da missionária estadunidense Dorothy Stang, tem uma rotina de privilégios no Centro de Recuperação de Altamira (CRRALT), onde cumpre sua pena de 30 anos. A unidade, onde 58 presos foram brutalmente assassinados em 29 de julho deste ano, é comandada por Patrícia Nazira Abucater Wal, que foi advogada do criminoso.
Fontes que pediram para não serem identificadas afirmam que Taradão mantinha um esquema dentro da unidade para ganhar dinheiro. O assassino de Stang administrava informalmente a lanchonete do CRRALT, que foi “temporariamente desativada” após o massacre. Lá, ele vendia diversos produtos superfaturados para os presos. Uma garrafa de água, por exemplo, custava R$ 10, um macarrão instantâneo R$ 8, uma garrafa de refrigerante de 2 litros podia custar R$ 18, um prato de arroz era vendido por R$ 20.
Ainda de acordo com os relatos, para a compra dos itens, tarefa realizada pela companheira de Taradão, Rosângela Galvão, cada um dos 343 presos (á época) da superlotada unidade pagava entre R$ 50 e R$ 100. Os produtos, então, entrariam na unidade com a autorização de Patrícia Wal. “Os presos e esposas de presos que escutamos nos disseram que o Taradão está lucrando com a lanchonete”, afirma uma fonte que esteve no CRRALT.
Na semana seguinte ao massacre que resultou na morte dos 58 presos, uma comitiva com integrantes do Judiciário, imprensa e entidades de direitos humanos visitou a unidade. Durante a vistoria, Patrícia Wal foi perguntada sobre os privilégios concedidos a Taradão. “Ela não negou, mas disse que todo o lucro era revertido para a unidade, que não recebe verba suficiente do estado para se manter”, afirmou uma fonte que pediu para não ser identificada.
Um ex-preso da unidade, que foi solto antes do massacre, também confirmou os privilégios de Taradão: “Ele circula livremente, pode sair de sua cela quando quer e tem acesso às áreas administrativas. A diretora sabia de tudo isso, sem dúvida.”
De acordo com outra fonte, Taradão é quem negocia com os presos da unidade. “Ele quem conversa com os homens e recolhe o dinheiro para a compra, mas sobra muito, porque uma água que custa R$ 1 no mercado, ele vende por R$ 10 lá dentro. Não sei como ninguém fala disso”, explica.
“Já estamos sabendo”, afirma Juliana Fonteles, presidente do Conselho Penitenciário do Estado do Pará, sobre as denúncias que Taradão recebe privilégios no CRRALT, incluso o comércio de alimentos dentro da unidade. “Se comprovado for, ela (Patrícia Wal) terá que responder administrativamente e criminalmente, é gravíssimo. É gravíssimo”, atesta.
“Várias denúncias de tortura”
O Centro de Recuperação de Altamira é parte da crise penitenciária que vive o Pará. Fonteles afirma que o Conselho tem recebido “várias denúncias de tortura” nas unidades. “Hoje, em Altamira, não foi inspeção carcerária, foi uma visita. Mesmo sendo uma visita, eles armaram um circo e constrangeram as autoridades. Nos fizeram aguardar uma hora para entrar no complexo prisional e não nos deixaram andar nem 200 metros, não entramos em bloco carcerário. Foi feito uma maquiagem”, denuncia a presidente do conselho.
Desde o dia 5 de agosto, o Complexo de Americano, em Santa Izabel, no Pará, é alvo da ação da força-tarefa de intervenção penitenciária, do Departamento Penitenciário Nacional (Depen). Na unidade, as facções Comando Classe A e o Comando Vermelho disputam o controle.
Em visita, também na manhã desta quarta-feira (21), ao Complexo de Americano, Fonteles afirma que foi hostilizada pelo chefe da Superintendência do Sistema Penitenciário do Estado do Pará (Susipe), Jarbas Vasconcelos, que a repreendeu por tentar conversar com presos durante a vistoria.
“Ele me disse que não deveríamos falar com os presos e que estávamos atrapalhando sua comitiva”, explica Fonteles. “Foi um tremendo bate boca dentro do complexo, ele expôs defensores públicos e procuradores, um vexame”.
Divulgado na última segunda-feira (19), o relatório da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa do Pará, que visitou a unidade no dia 12 de agosto, duas semanas após o massacre, critica Patrícia Wal. “In loco a comitiva de deputados e as autoridades convidadas foram recebidos pela Diretora da Casa penal, a Sra. Patrícia Abucater, ao adentrarem no presídio passaram por intensa revista, que durou em torno de 1 (uma) hora, visitando apenas parte do presídio – sem qualquer acesso as celas ou a presos – tendo acesso apenas a uma parte do local onde ocorreu o fato, o cenário de como ocorreu foi relatado pela diretora”, afirmam os deputados.
Ainda de acordo com os parlamentares da comissão, a crise penitenciária é mais profunda e encontra raízes na política brasileira de aprisionar demasiadamente. “Está claro que o ocorrido em Altamira espelha a falência do modelo de super encarceramento típico de países da periferia do capitalismo. Este acúmulo nos remete a certeza de que o enfrentamento das causas da violência está na forma como o estado atua para permitir que seus cidadãos usufruam de oportunidades de desenvolvimento humano, nas suas dimensões psíquico-sociais e ambientais”, aponta o relatório.
Susipe
Em nota, a Susipe confirmou os valores abusivos praticados na lanchonete da unidade de Altamira e não negou o envolvimento de Regivaldo Galvão, o Taradão, na comercialização dos itens.
A Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará (Susipe) informa que a cantina do Centro de Recuperação Regional de Altamira (CRRAlt) foi desativada, do mesmo modo como ocorreu nas casas penais do Complexo Penitenciário de Santa Izabel e Complexo Penitenciário de Marituba. Todas as lanchonetes estão sendo fechadas. As cantinas podem ter tido ou ainda preços abusivos ou inapropriados devido a influência de líderes de organizações criminosas e esta é a razão para a desativação das mesmas. Essa realidade pode existido em Altamira e em outras unidades, sim, mas isso está mudando.
A superintendência esclarece ainda que o sistema carcerário paraense não tinha controle, mas isso vem mudando desde o início da gestão. A entrada de alimentos e de visitas em Altamira segue rigorosamente as regras das Portarias 513/2019 e 514/2019, que regulamenta a entrada de comidas e objetos nas unidades e a visitação, estabelecida para uma vez por semana. As portarias são estaduais e é executada por todas as unidades prisionais do estado do Pará.
Há a resistência dos presos mediante as portarias que estão sendo cumpridas. Já ocorreram protestos, passeatas, revolta de internos, mas as portarias continuam sendo executadas com rigor e o controle sendo estabelecido. As portarias completas podem ser consultadas aqui:
– Portaria 513/2019 (entrada de alimentos e objetos)
– Portaria 514/2019 (visitas)
– Portaria 810/2019 (Atribuições do Pórtico / revista)
Edição: Rodrigo Chagas
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