Brasil247 – O jornalista Mauro Lopes escreve sobre a narrativa do “terrorismo” que está sendo construída por Jair Bolsonaro, seu clã e o bolsonarismo com o objetivo de alcançar “trancamento da democracia e o soerguimento de um Estado policial”; a mensagem do presidente aos grupos do whatsapp nesta sexta foi simultânea à divulgação de um suposto “atentado” que estaria sendo planejado contra ele e mais dois ministros
Mauro Lopes, editor do 247 e do Jornalistas pela Democracia – O bolsonarismo lançou uma operação política gravíssima na manhã desta sexta-feira (17) que tem como objetivo criar o clima para um golpe que implante o Estado policial. Foi uma operação articulada: enquanto Jair Bolsonaro divulgava em grupos de WhatsApp uma mensagem com tom conspiratório, acusando “corporações” (as “forças ocultas” de Jânio Quadros) pela crise do país e dizendo que “o Sistema” quer matá-lo, seu filho Eduardo investia no espantalho do “terrorismo”. Com o deputado federal Delegado Francischini, da ala mais extremada do bolsonarismo, Eduardo anunciou em um tweet perto das 10h que a Polícia Federal “investiga grupo terrorista que ameaça o presidente Jair Bolsonaro”. É a retórica mais surrada da extrema-direita para intimidar a sociedade e exigir poderes absolutos. A articulação será bem sucedida?
Francischini e Eduardo Bolsonaro veicularam no tweet: “A PF está tentando descobrir a identidade dos integrantes de um grupo extremista que ameaça matar o presidente Jair Bolsonaro e dois ministros. Precisamos nos unir”. Pouco antes, a revista Veja havia divulgado em seu site uma reportagem estranhíssima com o título “Polícia caça grupo terrorista que ameaça Bolsonaro e ministros”. No texto, menciona-se a uma articulação de uma tal “Sociedade Secreta Silvestre”, movimento que se autoproclamaria “ecoterrorista” e “anticristão”. A reportagem, estrambótica, tem todo cheiro de armação.
Havia, na reportagem de Veja, imagem de um suposto documento do Ministério Público referindo-se a uma investigação da Polícia Civil do Distrito Federal que, no texto da revista, transformou-se em “divisão antiterrorismo da Polícia Federal”, no mesmo espírito do twitter de Francischini e Eduardo Bolsonaro (veja aqui a reportagem).
Logo no começo da tarde, o Delegado Francischini apagou seu tweet, que desapareceu do perfil de Eduardo Bolsonaro -não está mais lá, nos perfis de ambos, mas a imagem dele compõe a ilustração deste artigo. Também no começo da tarde, a Polícia Federal negou formalmente qualquer investigação sobre “atentado terrorista”.
Mas a linha de ação do bolsonarismo está dada. Desde setembro passado, Bolsonaro e seus filhos insistem em afirmar, contra todas as evidências da investigação da PF, que teria havido um atentado político contra ele, no ataque à faca perpetrado por um homem desequilibrado, Adélio Bispo. O clã aponta o dedo, de maneira clara, para o PSOL. Na mensagem que distribuiu nesta sexta-feira, Bolsonaro afirmou que “o Sistema vai me matar”. Para o bolsonarismo, o “sistema” é a esquerda, especialmente o PT e o PSOL. É contra a esquerda que se pretender levantar a acusação de terrorismo para justificar o Estado policial.
No texto que Bolsonaro enveredou aos grupos de whatsapp de extrema direita, há ataques seguidos às “corporações”. O bolsonarismo não atribui à palavra seu sentido usual, de grandes grupos econômicos. Para a extrema-direita, as “corporações” são exatamente o PT, o PSOL os ambientalistas, a ONU, os movimentos sociais, o funcionalismo público, as Universidades e a esquerda em geral. Em uma palestra em 2018, antes de se tornar uma cabeça coroada do bolsonarismo, o agora ministro Abraham Weintraub acusou o PT e a esquerda de serem os verdadeiros donos dos bancos e grandes grupos econômicos. É nessa mixórdia de sentidos que a extrema-direita busca se apropriar da palavra corporações para torná-la em vez de denominação do poder econômico, numa acusação contra a esquerda.
Bolsonaro será bem sucedido? O fantasma do terrorismo será eficiente para criar o clima de “urgência” que o o bolsonarismo pretende para justificar o trancamento da democracia e o soerguimento de um Estado policial? Difícil dizer neste momento.
Mas a narrativa está aí, desde a facada, agora com a “Sociedade Secreta Silvestre”. Eles estão buscando espaço, espaço de articulação, unificar as fileiras da extrema-direita, sensibilizar os militares de espírito golpista.
Se der errado, Bolsonaro pode até renunciar. Mas não é renúncia que está em seus planos agora.
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