Em meio à discussão sobre a (falta de) estratégia política do governo federal para ver aprovada sua Reforma da Previdência, pouco se discute sobre o objetivo da proposta. A dimensão fiscal é importante, mas deveria ser objetivo secundário. Parece blasfêmia dizer isso, mas a necessidade de afastar a pobreza entre os idosos, garantindo-lhes manutenção da qualidade de vida, deveria ser a meta de um sistema previdenciário justo. Como chegar a isso sem quebrar a economia, possibilitando a continuidade do pagamento das aposentadorias e afastando eventuais privilégios é a discussão do caminho. Parece bobagem, mas quando deixamos claro a dignidade dos idosos como objetivo final, temos um projeto de país diferente. O Brasil é um das nações mais desiguais do mundo, com um grande naco de sua classe trabalhadora em extrema vulnerabilidade social. Apesar disso, um sistema de previdência solidário, que tire dos que têm mais para entregar aos que têm menos, é tachado de ultrapassado e inviável por ministros e outros representantes do governo Bolsonaro. Com isso, decretam a morte do atual sistema de repartição (em que os da ativa contribuem para bancar os aposentados), defendendo o de capitalização (em que cada um produz uma poupança individual, com pouca ou nenhuma contribuição ao sistema coletivo). A Constituição Federal prevê que o sistema de seguridade seja bancado não apenas por empregados e empregadores, mas também por tributos e contribuições. Alguns setores, como o financeiro, que não são intensivos em mão de obra, poderiam ser chamados a contribuir mais. Mas é mais fácil bater de frente com dezenas de milhões de trabalhadores do setor privado, pequenos produtores rurais e idosos em situação de miséria do que enfrentar os bancos e o mercado. Até porque essa área neste governo, como foi em tantos outros governos, é coordenada por quem está alinhado aos interesses dos bancos e do mercado.