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El País | PABLO GUIMÓN – Pessoas seguram seus telefones celulares com o flash ligado em solidariedade às vítimas do massacre de El Paso (EUA), neste sábado em Ciudad Juárez (México).HERIKA MARTINEZ (AFP)
“O nacionalismo branco é o mal, está inspirando as pessoas a cometerem assassinatos”, afirma o pré-candidato democrata Pete Buttigieg.
A ideia perversa por trás do massacre de El Paso (Texas, EUA), no caso de se confirmar oficialmente a autoria do manifesto racista supostamente publicado por Patrick Crusius antes de agir, é de uma devastadora simplicidade: matar hispânicos para deter uma suposta invasão do país. O Ministério Público investiga o massacre como um ato de terrorismo e considera acusar o atirador de crime de ódio.
Em meio ao luto pelas 20 vítimas fatais, há aqueles que não quiseram esconder sua fúria em relação ao presidente Donald Trump, que vem estimulando o medo da imigração desde que chegou à Casa Branca há dois anos e meio e que utilizou a palavra “invasão” para se referir à onda de famílias da América Central que chega maciçamente a cidades fronteiriças como El Paso em busca de asilo.
Um repórter perguntou no sábado a Beto O’Rourke, candidato nas primárias do Partido Democrata, nascido em El Paso e ex-congressista pela cidade, se a matança poderia ter a ver com o presidente Donald Trump, “seus tuítes supostamente racistas e sua retórica”. “Sim”, respondeu O’Rourke. Também disse que considerava o presidente dos Estados Unidos um “nacionalista branco”.
“Vimos um aumento dos crimes de ódio em cada um dos três últimos anos, durante uma Administração na qual temos um presidente que chama os mexicanos de estupradores e criminosos. Embora os imigrantes mexicanos cometam crimes em uma porcentagem menor do que os nascidos no país, ele tentou fazer que tivéssemos medo deles”, disse. “É racista e estimula o racismo neste país. E isso não apenas ofende nossas sensibilidades. Muda fundamentalmente o caráter deste país e leva à violência”.
O senador de Nova Jersey e também pré-candidato à presidência, Cory Booker, foi mais longe e disse que Trump era “responsável” pelo que aconteceu. “Quando você tem o presidente do mais alto escritório moral da nossa terra falando de ‘invasões’, ‘infestações’ e ‘países de merda’, esse tipo de coisa que sai de sua boca danifica o tecido moral do nosso país. Ele é responsável”, disse o democrata e acrescentou: “Ele é responsável porque não tomou medidas para condenar a supremacia branca”.
O autor do manifesto, que usa o conceito de invasão, frequente na retórica trumpista, parece antecipar que os dedos acusadores seriam apontados para o presidente quando o massacre fosse cometido. Suas opiniões sobre a imigração, diz o autor do manifesto, “são anteriores a Trump e sua campanha à presidência”.
Trump não avaliou até agora os possíveis motivos racistas do assassino de El Paso, nem respondeu às críticas dos democratas nos seis tuítes que dedicou a um massacre ao qual se refere como “não apenas trágico, mas um ato de covardia”. O chefe de gabinete interino da Casa Branca, Mick Mulvaney, defendeu o presidente afirmando que os ataques não têm a ver com razões de origem política. “Parece-me inadequado fazer essa conexão. São pessoas doentes”, afirmou Mulvaney em uma entrevista à ABC. “O presidente está tão triste e irritado quanto vocês”.
Mais pré-candidatos democratas se juntaram às críticas ao presidente por alimentar o ódio. “O nacionalismo branco é o mal, está inspirando as pessoas a cometerem assassinatos e está sendo consentido nos mais altos níveis pelo Governo norte-americano. Isso tem que acabar”, declarou o candidato democrata Pete Buttigieg. Outra concorrente do mesmo partido, Amy Klobuchar, disse que “Trump alimenta muito o ódio neste país”. Os pré-candidatos também fizeram chamamentos para impor urgentemente um controle sobre a venda de armas de fogo.
Os democratas há muito denunciam a agressiva retórica do presidente em relação aos imigrantes que cruzam a fronteira mexicana e seus recentes comentários depreciativos sobre congressistas de cor. “Não tenho nada com isso, porque muita gente está de acordo comigo”, respondeu o presidente quando perguntado há algumas semanas se estava preocupado que seus ataques a quatro deputadas democratas negras pudessem dar argumentos aos nacionalistas brancos.
O fato de o assassino ter escolhido El Paso —a mil quilômetros de sua casa, nos arredores de Dallas, Patrick Crusius dirigiu cerca de nove horas para cometer seu massacre—, a cidade fronteiriça por excelência, com 85% de população hispânica, tem um dramático poder simbólico. El Paso é, assim como Ciudad Juárez (México), da qual está separada apenas por uma cerca fronteiriça, uma vibrante cidade grande no deserto de dois milhões de habitantes.
Os hispânicos estão neste lugar desde o século XVII, muito antes dos antepassados de outros cidadãos que agora se dizem guardiões da genuína identidade norte-americana. A chegada à cidade de milhares de famílias da América Central em busca de asilo nos últimos meses sobrecarregou a guarda de fronteira e os serviços de acolhida, e colocou este lugar no centro do debate político. A Administração Trump tentou utilizá-la como símbolo dessa suposta invasão que inclui criminosos perigosos e estupradores, e os democratas denunciam a incapacidade do presidente de responder a uma crise humanitária.
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