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A valentia loquaz de Deltan Dallagnol, coordenador da Lava Jato, tem um limite: não desagradar ao governo Bolsonaro. E nisso ele encontra um parceiro e tanto: Sergio Moro. Novos diálogos revelados pelo site “The Intercept Brasil” demonstram a administração política que Dallagnol dá até às suas declarações. Um episódio ilustra a politicagem na força-tarefa de maneira constrangedora.
Os folguedos de Flávio Bolsonaro (centro) desarrumaram o discurso oficial dos paladinos Deltan Dallagnol (esq.) e Sério Moro (dir.): sobrou a empulhação
A valentia loquaz de Deltan Dallagnol, coordenador da Lava Jato, tem um limite: não desagradar ao governo Bolsonaro. E nisso ele encontra um parceiro e tanto: Sergio Moro. Novos diálogos revelados pelo site “The Intercept Brasil” demonstram a administração política que Dallagnol dá até às suas declarações. Um episódio ilustra a politicagem na força-tarefa de maneira constrangedora.
Dallagnol recebe um convite da reportagem do “Fantástico”, da TV Globo, para dar uma entrevista sobre o fim do foro especial para deputados e senadores, uma das militâncias a que se dedicou a direção de jornalismo da emissora. A personagem principal da notícia, que receberia tratamento necessariamente negativo, dadas as circunstâncias, era o deputado Paulo Pimenta (RS), do PT. Processo de que é réu sairia do Supremo e iria para a primeira instância porque relativo a caso anterior ao mandato e sem relação com este. Mas o “Fantástico” deixa claro que se vai falar também sobre Flávio Bolsonaro.
No dia 21 de janeiro deste ano, Dallagnol envia a seguinte mensagem a seus pares no grupo “Filhos de Januário 3” (conforme o original):
DALLAGNOL – 16:44:44 – Pessoal, temos um pedido de entrevsita do fantástico sobre foro privilegiado. O caso central é bom, envolvendo o Paulo Pimenta, se isso for verdade rs. O risco é eles decidirem no fim focar no Flávio Bolsonaro e usarem nossas falas nesse outro contexto. De um modo ou de outro, o que temos pra falar é a mesma coisa. Além disso, algumas informações que buscam não temos (são da PGR). A questão é se é conveniente darmos entrevista para essa reportagem ou não. Eu não vejo que tenhamos nada a ganhar porque a questão do foro já tá definida. Diferente de uma matéria sobre prisão em segunda instância…
Que coisa fabulosa!
Notem que, segundo o coordenador da força-tarefa, “o caso central é bom, envolvendo o Paulo Pimenta”. Ou por outra: bater num petista era uma vantagem e estava adequado à metafísica influente na turma. E, de fato, a mensagem enviada pela Globo, repassada por Dallagnol, deixa claro: “suspeita contra o Pimenta será nosso principal case numa reportagem sobre os casos em que políticos perderam o foro, devido ao entendimento do Supremo de que a prerrogativa só existe para crimes cometidos durante o mandato e que dizem respeito ao mandato.” Mas aí acrescenta o jornalista (no caso, da RBS, filiada no Rio Grande do Sul): “Citaremos também o caso F. Bolsonaro, que surgiu após o início da nossa apuração”.
E aí Dallagnol treme nas bases: “O risco é eles decidirem no fim focar no Flávio Bolsonaro e usarem nossas falas nesse outro contexto.” A desconfiança do procurador não faz jus à fidelidade da emissora à Lava Jato, de quem é a mais vistosa e poderosa porta-voz — e não apenas da força-tarefa de Curitiba.
Dallagnol não vê nada de útil em conceder a entrevista porque eles já ganharam a batalha do fim do foro especial. E falar sobre Flávio não lhe pareceu conveniente… Se fosse só para malhar o petista Pimenta, aí seria bom… Mas Flávio???
NÃO ERA A PRIMEIRA VEZ
Não era a primeira vez que Dallagnol evidenciava que melhor seria não mexer muito com o Zero Um. No mesmo grupo, no dia 8 de dezembro do ano passado, escreveu:
DALLAGNOL – 09:04:38 – Em entrevistas, certamente vão me perguntar sobre isso [Flávio]. Não vejo como desviar da pergunta, mas posso ir até diferentes graus de profundidade. 1) é algo que precisa ser investigado; 2) tem toda a cara de esquema de devolução de parte dos salários como o da Aline Correa que denunciamos ou, pior até, de fantasmas.
Em outra conversa, com o procurador Roberson Pozzobon (o “Robito”, aquele com quem queria criar empresa de palestras em nome das respectivas mulheres para “lucrar”), o próprio Dallagnol pondera:
“DALLAGNOL – 10:04:00 – Não sei se convém o nível 2. Não podemos ficar quietos, mas é neste momento um pouco como com RD [Raquel Dodge]. Vamos depender dele pra reformas… Não sei se vale bater mais forte
CADÊ O VALENTÃO?
Pois é… Nada disso lembra aquele procurador sempre valentão, que dava plantão nas redes sociais quando algo estava em votação no Supremo e que saía por aí tonitruando a sua moralidade impecável, posando, se necessário, de vítima; afirmando que a função que exercem os membros da força-tarefa lhes cobra quase uma dedicação de mártires — no seu caso, um mártir que anunciou à própria mulher ganhos líquidos de R$ 400 mil com palestras em 2018.
O COMPORTAMENTO DE MORO
Os procuradores também falam do comportamento de Sergio Moro depois que o caso Flávio Bolsonaro veio a público. Prestem atenção a esta sequência daquele mesmo 8 de dezembro de 2018, pouco antes de Dallagnol decidir entre a coragem e covardia, ficando com a segunda.
A conversa começa com o envio de um link de reportagem do UOL sobre o depósito de R$ 24 mil que Fabrício Queiroz fizera na conta de Michelle Bolsonaro, mulher do, à época, presidente eleito:
DELTAN DALLAGNOL – 00:56:50 – https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2018/12/07/bolsonaro-diz-que-ex-assessor-tinha-divida-com-ele-e-pagou-a-primeira-dama.htm
DALLAGNOL – 00:58:15 – [imagem não encontrada]
DALLAGNOL – 00:58:15 – [imagem não encontrada]
DALLAGNOL – 00:58:38 – COAF com Moro
DALLAGNOL – 00:58:40 – Aiaiai
JULIO NORONHA – 00:59:34 – (figurinhas de macaquinhos tampando os olhos)
DALLAGNOL – 01:04:40 – [imagem não encontrada]
JANUÁRIO PALUDO – 07:01:20 – Isso lembr
PALUDO – 07:01:48 – Lembra algo Deltan?
PALUDO – 07:03:08 – Aiaiai
JERUSA VIECILLI – 07:05:24 – Falo nada … Só observo
DALLAGNOL – 08:47:52 – Kkk
DALLAGNOL – 08:52:01 – É óbvio o q aconteceu… E agora, José?
DALLAGNOL – 08:53:37 – Moro deve aguardar a apuração e ver quem será implicado. Filho certamente. O problema é: o pai vai deixar? Ou pior, e se o pai estiver implicado, o que pode indicar o rolo dos empréstimos?
DALLAGNOL – 08:54:21 – Seja como for, presidente não vai afastar o filho. E se isso tudo acontecer antes de aparecer vaga no supremo?
DALLAGNOL – 08:58:11 – Agora, Bolso terá algum interesse em aparelhar a PGR, embora o Flávio tenha foro no TJRJ. Última saída seria dar um ministério e blindar ele na PGR. Pra isso, teria que achar um colega bem trampa
ATHAYDE RIBEIRO COSTA – 08:59:41 – É so copiar e colar a ultima denuncia do Geddel
ROBERSON POZZOBON – 09:02:52 – Acho que Moro já devia contar com a possibilidade de que algo do gênero acontecesse
POZZOBON – 09:03:19 – A questão é quanto ele estará disposto a ficar no cargo com isso ou se mais disso vir
Moro, como sabemos, silenciou sobre o caso Fabrício. O paladino contra a corrupção enfiou o rabo da moralidade entre as pernas e preferiu fugir do assunto. Fez o mesmo também em outro caso que chega a ser vexaminoso: o de seu colega de ministério Marcelo Álvaro Antonio (Turismo) e o laranjal que o cerca.
Os diálogos divulgados neste domingo mostram a parcialidade e o direcionamento político da “luta contra a corrupção” travada por Moro e Dallagnol, entre outros.
A VAGA NO STF
E agora muito importante corre o risco de se perder em meio às conversas. Escreve Dallagnol:
DALLAGNOL – 08:54:21 – Seja como for, presidente não vai afastar o filho. E se isso tudo acontecer antes de aparecer vaga no supremo?
No dia 12 de maio, em entrevista a Milton Neves, da Band, Bolsonaro afirmou que, ao convidar Moro para o Ministério da Justiça, prometeu que o indicaria para uma vaga no Supremo. Ficou claro que tal promessa tinha feito parte do pacote de ofertas para que aceitasse a pasta. No dia seguinte, o ministro da Justiça desmentiu o chefe. E ficou o dito pelo não-dito.
Notem que, muito antes, ainda em dezembro, Dallagnol já tratava da indicação de seu amigo de fé, irmão, camarada para a vaga no tribunal. E ainda deixa claro que, se Moro resolvesse se engajar na apuração das lambanças havidas no gabinete de Flávio, a indicação não sairia.
E Moro, como sabemos, não se engajou.
Só não sei se haverá tempo para ser ministro do Supremo.
Digam: a Lava Jato não lhes parece, a cada dia, mais isenta, mais independente, mais imparcial e interessada apenas em combater os malfeitores?
Ah, sim: os valentes todos afirmam não reconhecer a autenticidade das conversas. A Globo diz não comentar conversa de seus jornalistas com fontes. Mas não nega, claro!, o envio da mensagem. Nem poderia. Ela é verdadeira, a exemplo de todas as outras.
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